quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Excesso de hoje, carência de ontem e de amanhã.

Apesar de um certo cabalista esquecido na Península Ibérica ter dito que a experiência da eternidade é viver o presente e perceber que o passado e o futuro não existem no aqui e no agora, essa postura torna-se fértil quando nos alimentamos de um olhar mais ao longe. Ao contrário, os sujeitos ao estarem desligados daquilo que faz a ligação com os sentidos (naquela idéia de direção) da própria existência, encontram-se míopes diante do "fato" de que o corpo da sensação, a alma do sentimento e o espírito da intuição estão intimamente conectados. Portanto, ser moderno não significa necessariamente apenas usufruir de uma racionalidade metódica, mas sim e provavelmente de desamparo. Nâo se trata apenas do silêncio de quem está ao nosso lado assistindo televisão; não se enfoca simplesmente a enxurrada de monólogos numa época de Internet; muito menos, a prioridade dos relacionamentos virtuais em detrimento dos sabores, cheiros e tatos; mas, uma possível causa, a saber: excesso de hoje e carência de ontem e de amanhã. Em outras palavras, foi criada uma resistência ideológica a tudo que é tradição. O passado, o vivido, passou a ser estigmatizado como "desatualizado". Em consequência da ausência dessa memória, torna-se extremamente difícil construir um projeto de futuro. Claro que não existem caminhos, eles se fazem ao caminhar, porém, certos vôos precisam de instrumentos. O que sobra? O hoje, ou melhor, o milimétrico aqui e agora, que se torna pequeno diante de toda fome da alma e do espírito, restando a sensação de vazio. Os comportamentos compulsivos se tornam um sintoma dos dias atuais, alimentados pela própria sociedade de consumo. O templo são os shopping centers. Tudo isso justifica a epidemia de ansiedade e depressão dos tempos de hoje. A primeira, de certa forma, é o medo do futuro e a depressão, o luto mal elaborado daquilo que se perdeu no tempo de ontem.

Um comentário:

  1. É isso mesmo, meu caro! O que seria de nós sem nosso passado? Seres opacos, sem vida, sem sombra, vazios... E, por estarmos vazios, buscamos esse nada dentro do consumismo. E, como este não nos preenche, consumismo cada vez mais. Até nos transformarmos zumbis, anônimos, perdidos no tempo.

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